29 de abril de 2016

O concílio de Jerusalém


A Igreja primitiva nasceu, como um rebento, do judaísmo. Seus líderes eram judeus, e a Igreja aproveitava da distribuição das sinagogas pelo mundo romano para fazer, com sucesso, a implantatio ecclesiae. Neste ambiente profundamente judaico, surgiu uma certa teologia segundo a qual, para que alguém se salvasse, deveria, necessariamente, participar da Antiga Aliança, circuncidando-se e observando as antigas leis mosaicas. Tal teologia (chamada de judaizante) tinha uma enorme influência entre os cristãos, difundindo-se, a partir de Jerusalém, por todas as demais igrejas locais. O líder desta facção era, ninguém mais, ninguém menos, do que São Tiago, bispo de Jerusalém e figura proeminente da Igreja primitiva.
No entanto, São Paulo liderava os adeptos de uma outra teologia. Contemplando a história da salvação, ele percebeu que, na verdade, Cristo, ao morrer na Cruz, substituiria toda a Lei Antiga por uma Nova Aliança, realizada em Seu preciosíssimo sangue. Era este sangue, e apenas ele, o penhor de nossa salvação, sendo desnecessário (e, em seu entender, inconveniente) que se observassem os antigos rituais judaicos.
A disputa entre as duas facções, aos poucos, foi se acirrando. Discussões sérias ocorriam. Para resolvê-las, a Igreja primitiva, orientada pelo Espírito Santo, convocou aquele que seria o primeiro Concílio de sua história. Reuniram-se, em Jerusalém (note-se que esta era a diocese de São Tiago), todos os Apóstolos e Anciãos e, sob a direcção de São Pedro, se puseram a discutir a questão.
De um lado, Paulo, Barnabé e seus discípulos expunham a sua ideia. De outro, os companheiros de São Tiago se punham a rebatê-las, certamente encorajados pelo fato de que este combate teológico, realizado em Jerusalém, favorecia a vitória dos judaizantes. Fez-se uma discussão. O momento era dramático para São Paulo, que via cada vez mais distante a possibilidade de que sua tese saísse vencedora.
Foi então que Pedro falou. E com que coragem falou Pedro! Não obstante estar em Jerusalém (onde os judaizantes eram maioria), não obstante a venerável presença de São Tiago, o velho São Pedro pronunciou-se, com assombroso destemor, em favor de São Paulo. Como líder da Igreja, ex-catedra, deu a primeira manifestação solene e infalível de que se tem notícia, afirmando que São Paulo tinha razão, e afastando a necessidade de observância da lei mosaica para a nossa salvação. Como era de se esperar, esta definição dogmática e solene até hoje permanece em vigor, e nunca mais os cristãos tiveram dúvidas a respeito. Veja como São Lucas descreveu este discurso em At. 15,7-11.
Depois disto, falou São Tiago. O mesmo, amante da lei mosaica, propôs, então, algumas normas pastorais de nítida influência judaizante. Veja o seu discurso: At.15, 13-21
Não se pode afastar, por completo, a afirmação de que o objectivo de São Tiago era o de salvar um pouco do judaismo que, com a declaração de São Pedro, se transformava em algo ultrapassado para os cristãos. Como católicos, no entanto, devemos acreditar que, ainda que se tratando de normas pastorais, as mesmas foram inspiradas pelo Espírito Santo e eram de observância obrigatória (como as do Concílio Vaticano II). De facto, a observância das mesmas evitava que os judeus se escandalizassem dos cristãos e fechassem, aos mesmos, as portas das sinagogas. Isto permitiu que a implantatio ecclesiae prosseguisse a partir da distribuição geográfica das mesmas. No entanto, por serem normas meramente pastorais, foram deixadas de lado posteriormente, sem que isto implique em qualquer contradição
Este foi o Concílio de Jerusalém. São Paulo, alegre com a decisão de Pedro, e aceitando as normas pastorais, foi a Antioquia dar a notícia para aquela Igreja.

Assim, a fé cristã não está mais ligada ao judaísmo. Ninguém é obrigado a sujeitar-se a uma «transplantação cultural» para ter acesso ao Evangelho. A Igreja torna-se verdadeiramente universal. Não há dúvida de que as duas grandes tendências, a de Paulo e a de Tiago, continuam no interior da Igreja. Uma luta de influência continua, mas Paulo esforça-se por manter a unidade entre os grupos levando a efeito uma colecta em todo o Império a favor dos cristãos de Jerusalém em dificuldade (Gal.2,10; At.24,17) 

2 comentários:

Anónimo disse...

Nós éramos 3 primos. Eu era o menino pobre filho de um carpinteiro pobre, os outros 2 eram meninos ricos filhos de fazendeiros ricos. E Deus agia e agiu assim: eu nunca fui passear nas fazendas deles, eu preferia aqueles que não tinham uma fazenda, tinham uma roça. E o tempo trouxe uma resposta fulminante...tudo foi reconfigurado...:)

Anónimo disse...

Deus não atropela a vontade humana, mas age na história. Foi a 2000 anos, mas é como se fosse hoje. Barnabé não foi, foi enviado por Deus atrás de Paulo em Tarso. É que Paulão tinha que participar da fundação da Igreja em Antioquia e como alguns ser também chamado pela 1ª vez de Cristão...:)

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