A tristeza que vem de Deus, diz São Paulo, opera a
penitência para a salvação; e a tristeza que vem do mundo opera a morte. A
tristeza pode pois ser boa ou má, segundo os efeitos que em nós produz.
É verdade que há mais efeitos maus do que bons; porque só
há
dois bons:
1) misericórdia
2) penitência
E seis maus:
1)angústia
2)preguiça
3) indignação
4) inveja
5) impaciência
6) ciúme.
É por isso que diz o sábio: “A tristeza mata muita gente, e
nada com ela ganhamos”; porque há dois bons regatos que dele provém, há seis
maus.
O inimigo serve-se da tristeza para exercitar a
perseverança dos bons; porque, assim como procura alegrar os maus no pecado,
procura entristecer os bons nas boas obras; e assim como não pode atrair para o
mal senão tornando-o agradável, também não pode afastar do bem, senão
tornando-o aborrecido.
O demônio só pede tristeza e melancolia; porque assim como
ele está para toda a eternidade triste e melancólico, assim desejaria que todos
o estivessem também.
A tristeza má perturba a alma e inquieta-a, incute-lhe
temores desregrados, afasta-a da oração; atormenta o cérebro, e priva a alma do
conselho, resolução, juízo e coragem, absorvendo-lhe completamente as forças.
Em breve tempo estará como um rigoroso inverno, que apaga toda a beleza da
terra e atormenta todos os animais; porque priva a alma de toda a consolação e
torna impotentes as suas faculdades.
O rei Davi não se queixa só da tristeza, quando diz:
“Porque estas triste, minha alma?”, mas somente do custo e da vacilação dizendo:
“Porque te perturbas?”
A tristeza boa deixa uma grande paz e tranquilidade no
espírito. É por isso que Nosso Senhor, dizendo aos seus apóstolos: “Vós
estareis tristes”, acrescenta: “não se perturbe o vosso coração; nada temais”.
Eis que a minha grande amargura esta em paz, diz Isaías.
A tristeza má vem como saraiva, com uma mudança inopinada e
grandes terrores e impetuosidade, e de repente, sem que se possa dizer donde
vem, porque não se deixa adivinhar. Entretanto que a tristeza boa chega
docemente à alma, como uma chuva fina, que tempera os ardores das consolações,
e com algumas razões precedentes.
A tristeza má perde o coração e atormenta-o tornando-o
inútil, fazendo-lhe perder o cuidado das boas obras, como diz o salmista, e
como Agar, que deixou o filho debaixo da árvore para chorar.
A tristeza boa dá força e coragem, e não deixa nem abandona
um bom desígnio; esta foi a tristeza de Nosso Senhor, que embora fosse a maior
que existiu, não lhe impediu a oração nem o cuidado dos seus apóstolos.
E Nossa Senhora, tendo perdido seu filho, ficou muito
triste; mas nem por isso deixou de o procurar com diligência, como também fez
Madalena, sem se demorar a lamentar-se e chorar inutilmente.
A tristeza pecaminosa obscurece o entendimento, priva as
almas de conselho, de resolução e discernimento, como sucede aqueles de quem
diz o Salmista que “os perturbaram e abalaram como um ébrio, e ficaram privados
de sabedoria”(Salmo CVI, 27). Procuram-se remédios aqui e além, confusamente
sem tino e às apalpadelas.
A tristeza santa abre o espírito, torna-o claro e luminoso,
e como diz o Salmista, dá inteligência.
A pecaminosa impede a oração e a contemplação, e faz
desconfiar da benignidade divina; pelo contrário a santa fortalece-nos na
bondade de Deus, e impele-nos a invocar a sua misericórdia.
“As tribulações e angústias perturbaram-me; mas os vossos
mandamentos foram a minha meditação”.
Em suma, os que estão possuídos da tristeza pecaminosa
mergulham-se em uma infinidade de horrores, erros e temores inúteis, receando
ser abandonados por Deus de incorrerem na sua desgraça e de se lhe não apresentaram
para lhe pedir perdão.
Tudo lhe parece contrário à sua salvação; são como Caim,
que pensava que todos os que encontrava o queriam matar. Julgam que Deus será
injusto e severo só com eles por toda a eternidade; pensam que os outros são
muito mais felizes do que eles. É da soberba que provém tal crença a qual lhes
persuade que deveriam ser muito melhores do que os outros e mais perfeitos do
que ninguém.
A tristeza santa, porém discorre assim: “Sou uma criatura
miserável, vil, e abjeta: logo Deus usará de misericórdia para comigo; porque a
virtude acrisola-se na doença, e não se aflige por ser pobre, miserável.”
Ora o fundamento da oposição que se oferece entre a boa e
má tristeza, é que o Espírito Santo é o autor da tristeza santa e por ser o
único consolador, as suas operações trazem consigo luz e claridade. Por
consequência, essas operações são inseparáveis do verdadeiro bem; porque os
frutos do Espírito Santo, diz São Paulo, são: caridade, gozo, paz, paciência,
benignidade, longanimidade..
Pelo contrário, o espírito maligno, autor da má tristeza,
(porque não aludo à tristeza natural que tem mais necessidade de medicina do que
de teologia) é um verdadeiro estrago, tenebroso e aniquilador, e os seus frutos
só podem ser: ódio, tristeza, inquietação, pesar, malignidade e desalento. Ora
todos os sinais da tristeza má são os mesmos que os do mau temor.
Pensamentos Consoladores de São Francisco de Sales via
saopiov.org
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